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12 novembro 2020

12 de novembro: dia mundial do Hip Hop

Um dia para as "tribos urbanas"

Luzia Helena Brandt Martins

Valdoir Simões Campelo

 

Origem do Hip Hop no Brasil

O hip hop por muito tempo foi um termo indefinido ou confundido no Brasil. Marcos Alexandre define “hip hop” como “muito mais que música e dança, muito mais que pular e requebrar – significado literal da tradução em inglês do termo. Ele busca conscientizar, educar, humanizar, promover, instruir e divertir os moradores da periferia, além de reivindicar direitos e o respeito a esse povo” (FOCHI, 2007).

Segundo Marcos, o movimento no Brasil é baseado em três elementos que fundamentam o hip hop: o break, o rap e o grafite. O break é a manifestação corporal, a dança que, em Nova York, quando criada, serviu para conter brigas em festas. Alguns jovens que organizavam bailes, festas de rua e em escolas na periferia, resolveram criar disputas dentro dos bailes, por meio da dança, no intuito de conter as brigas que aconteciam nas ruas. Assim, incentivavam a dançar o break, no lugar de brigar [...].(FOCHI, 2007). Já na cultura brasileira, a dança surge com o objetivo de divertir e em busca de auto-estima, segundo Marcos Alexandre (2007).

O rap significa “Rhythm and poetry”, ou seja, é uma forma de poesia cantada a partir de um determinado ritmo que busca trabalhar as letras e rimas de músicas. Por pautar assuntos urgentes da sociedade e, principalmente, para os excluídos, fortaleceu o movimento no Brasil, Sobre isso o autor fala que:


Mesmo com a dura realidade da pobreza, desemprego, analfabetismo, da periferia, os hip hopers parecem compreender perfeitamente essa necessidade da educação, de saber entender, expressar de modo compreensível os problemas que os assolam (FOCHI, 2007).

 

E o grafite, por sua vez, tem grande reconhecimento na cultura brasileira. É usado para manifestações visuais artísticas e, preponderantemente, retrata as periferias brasileiras. Atualmente, o grafite está sendo feito por artistas provenientes da periferia e parte das cidades grandes o incorporam como uma das manifestações culturais, pois as imagens buscam fazer pensar sobre problemas da periferia e da realidade urbana, de acordo com Fochi (2007).

Conhecimento

Para Fochi, a existência de um quarto elemento – o conhecimento – seria a base de sustentação que não permitiu a banalização, a transformação do rap, do break, num modismo ultrapassado. É a conscientização, o conhecimento, tido como alvo pelos precursores do hip hop no Brasil, ensinada pelas ONGS aos jovens da periferia um dos principais fatores que consolida, fortalece e perpetua esta cultura.

Assim, nota-se a diversidade de expressões artísticas que o movimento hip hop carrega. E como todo movimento cultural “não-europeu” e esse, em particular, sendo originalmente periférico e estrangeiro, é importante ressaltar, o preconceito, as perseguições e os discursos para desqualificar o mesmo, que resulta em uma série de dificuldades sociais e políticas para se expandir e ser respeitado como um movimento cultural e gênero/estilo musical.

Rap no Brasil

O rap surgiu no Brasil por volta da década de 70 e 80 com Joe Bataan (“Rap-o-Clap”), Grand Master Flash (“The Message”), Kurtis Blow (“The Breaks” e várias outras) e Sugar Hill Gang (“Rapper’s Delight”). Mas foi nos anos 2000 que o “rap brasileiro” teve mais força e começou a ser reconhecido como produção artística.

Quebrando algumas barreiras, o grupo responsável por esse alcance foi o “Racionais”, que, “[...] alcançou todas as regiões do país e, numa forma estética apurada, criticou a violência que permeia a sociedade brasileira.”, segundo Bráulio Roberto (2016). O autor ainda destaca outros artistas e grupos que foram responsáveis por cantar rap no Brasil e usá-lo para denunciar as injustiças e desigualdades da sociedade brasileira, são eles: Mano Brown, Edi Rock, KL Jay e Ice Blue. E, como todo gênero musical, novos artistas entram para o ramo e novas faces e fases do rap vão se constituindo.

São as “novas escolas”, como anunciam Bráulio (2016). Neste momento, novos nomes surgem de batalhas de rimas ou batalhas de MCs. O autor ainda lista fatores que diferenciam a “nova escola” do rap da “velha escola”: “Maior escolaridade, maior acesso a bens de consumo, flexibilidade no trato com a grande mídia e considerável traquejo comercial seriam traços comuns a esses novos artistas [...].” (LOUREIRO, 2016).

Atualmente, o Brasil conta com grandes nomes do rap, como Marcelo D2, Emicida, Criolo, Djonga, entre outros. E como já foi dito, o contato com a internet facilitou para os rappers, um maior acesso e alcance de suas músicas e vozes, tornando-os reconhecidos mundialmente. Outro fator importante do rap é como a própria diversidade musical transita em suas músicas e sonoridades que, por vezes, faz parecer que não é rap ou algo produzido por um rapper, como é o caso do álbum de 2015, do Emicida: Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa...

No rap atual é comum encontrar referências e citações de grandes artistas da música brasileira, como em Amarelo, de Emicida, que usa a voz e letra de Belchior, com parcerias representativas nas vozes e pautas sociais, como Pablo Vittar e Majur. Além destas parcerias, Emicida já cantou músicas com Caetano Veloso, Zeca Pagodinho, Pitty, Vanessa da Mata, Ivete Sangalo, Erasmo Carlos, entre outros. Além de seus companheiros no movimento – Rael, Djonga, Drika Barbosa, Karol Conka, Rincon Sapiência – questões ecléticas e culturais e a busca por conhecimento e expansão em áreas e sons diferentes do já conhecido “rap” tem feito parte da produção no Brasil.

Assim como outros artistas de outros gêneros musicais que alcançaram o sucesso e expandiram suas obras e nome, Emicida fundou uma marca que trabalha com vários segmentos, chamada Laboratório Fantasma. Ela trabalha com produções musicais, roupas e acessórios confeccionados pela própria marca, além de discos e livros, incluindo os de autoria de Emicida. Como é o caso dos dois livros infantis: Amora e o E foi assim que eu e a escuridão ficamos amigas.

Ao olhar para estes artistas, para a origem do hip hop e para a história do Brasil, percebe-se que vivemos em um momento histórico para a música e para o Brasil. É através da música que muitas pessoas saem de determinadas condições sociais e veem suas vidas tomando outros rumos, com novas portas e horizontes se abrindo.

O rap não deixa de “servir” para isso.

É um momento de reparação histórica, de compreensão com todas as lutas, gritos e lágrimas ao nosso redor.

Emicida e Ivete Sangalo na música Trevo, Figurinha e Suor na Camisa, cantam:

 

“[...] Eu sou o sonho dos meus pais, que eram sonhos dos avós; Que eram sonhos dos meus ancestrais; Vitória é sonho dos olhares, que nos aguardam nos lares; Crendo que na volta somos mais [...]”

 

Este trecho fala por si só.

Em outro, os dois cantam: “[...]É o primeiro diploma; A viagem, a nova porta que se abre [...]”.

É sobre oportunidades, sonhos e conquistas.

Mas, principalmente, as conquistas dos que são discriminados em uma sociedade patriarcal e racista.

Nas músicas, demandam por um olhar respeitoso e reparações. Igualdade enquanto seres humanos e diferença enquanto indivíduos socioculturais. Marcos Alexandre (2007) finaliza sintetizando as questões do hip hop enquanto tribo urbana e movimento cultural:

Assim, concluímos que o hip hop pode ser considerado como uma cultura de rua, e muitos de seus adeptos, como integrantes de uma tribo urbana, já que aderem ao estilo apenas por curtirem a música, tendo como único intuito a diversão, o convívio com o grupo, o estar junto sem preocupação futura, o ingresso unicamente pelo estilo estético. Por outro lado, tudo indica que isso certamente se esvaziaria, sofreria mutações ao longo dos tempos, se não houvesse uma causa, se, por trás das roupas, música e pintura, não houvesse a luta, o engajamento social e uma estratégia de atuação (FOCHI, 2007).

 

Por isso, é importante e é preciso valorizar todos os tipos de expressões artísticas, culturais e de luta. Elas fortalecem quem somos e quem podemos ser, permite-nos novos horizontes e olhares ao redor de nós e do mundo!

Vamos respeitar, valorizar e participar de movimentos culturais, como o hip hop!

Referências:

FOCHI, Marcos Alexandre Bazeia. Hip Hop Brasileiro Tribo urbana ou movimento social? FACOM - nº 17 - 1º semestre de 2007.

LOUREIRO, Bráulio Roberto de Castro. Arte, cultura e política na história do rap nacional. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros. 2016.

EMICIDA. Trevo, Figurinha e Suor na Camisa. Laboratório Fantasma. 2020.

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